18 de ago. de 2013

A Pedra Preta: 7 – As matas fechadas

Por: Colorado Teus

Satisfação,

O livro continua, segue o link para quem perdeu o começo, é sugerido ler isto antes: http://coloradoteus.blogspot.com.br/p/pedra-preta.html

Capítulo 7 – As matas fechadas 

 O dia já não era tão “bonito” como o anterior; bonito aqui entre aspas pois o Sol estava passeando por meio de algumas nuvens que vinham do sul, parecia que uma chuva estava para começar. Após um pouco de caminhada resolveu comer alguma coisa, mas notou que sua comida poderia acabar quando mais precisasse, pois não sabia quanto tempo ainda demoraria para chegar ao seu destino, e não poderia mais voltar para a cidade naquele momento, então, resolveu ir atrás de outras comidas para evitar que isto acontecesse. Percebeu que a vegetação estava mais densa em uma direção e foi para aquele lado na esperança de achar um rio, que foi o que aconteceu. 




 O rio era razoavelmente limpo mas dava para perceber alguns peixes, que pareciam bagres, nadando vagarosamente à margem. Pensou em como poderia fazer para capturar um daqueles para fazer um peixe assado, mas sabia que não seria fácil. Chegou à conclusão que precisaria de uma lanceta para pegar um, pois não tinha vara ou anzol, assim, foi atrás de material para fazer uma. Andou um pouco e achou um bambuzeiro, ótimo para fazer o que ele precisava. Conseguiu cortar com seu canivete um bamboo que parecia um tanto duro e, caprichosamente, lapidou uma ponta bem afiada em uma das extremidades.

 Voltou ao rio e começou as tentativas, não era fácil capturar o peixe daquela maneira; mesmo quando ele conseguia jogar a lanceta perfeitamente onde ele via o reflexo da presa, parecia que não chegava nem a acertar de raspão. Conseguiu acertar uma hora que conseguiu posicionar a lança bem em cima, e não na vertical, machucando o animal, que começou a nadar deficientemente em círculos. Entrou no rio e conseguiu pegá-lo com suas mãos.

 Fez uma fogueira, o espetou numa estaca de bamboo e o assou durante um tempo. Não ficou tão gostoso quanto ao que sua mãe fazia, mas deu para comer, encher a barriga e guardar um pouco para outra hora. Pouco depois as nuvens fecharam o céu e a chuva parecia ser eminente, logo, precisava arrumar um lugar para se abrigar pois não tinha uma barraca, mas levou sua lanceta consigo, pois era bem leve devido ao material.

 Correu na direção contrária à chuva, mas a floresta ficou mais e mais densa, dificultando muito sua passagem. Tomou seu canivete à mão e cortou muitos cipós enquanto tentava passar por alguns lugares, porém, chegou a um lugar que estava muito difícil de transpassar, quando a chuva o pegou. Neste momento ele não teve o que fazer a não ser rezar, rezou para seu anjo da guarda para ajudá-lo naquela situação.

 Não demorou a começar uma ventania danada, tanto que em um pequeno espaço de tempo ele se arrependeu de ter rezado; em pouco tempo ele parou de sentir a chuva batendo em seu corpo, enquanto via chover à sua volta ainda. Situação bastante estranha, com um vento até um pouco quente. Agora que estava protegido da chuva, de certa forma, pode pensar melhor em que caminho seguir, foi então que percebeu que os ventos tinham uma direção fixa e resolveu segui-la. Andou um pouco, passou por um caminho cujos cipós pareciam ter sido abertos pelo próprio vento e achou uma encosta de uma pequena montanha. Foi até lá e viu uma pequena cabana feita encostada em uma rocha dessa, a rocha formava uma das pequenas paredes e as outras eram feitas de bamboo. Na rocha estava “pixado”:

 “Well, she's walking through the clouds
with a circus mind that's running wild.
Butterflies and zebras and moonbeams
and fairy tales,
That's all she ever thinks about ...
Riding with the wind..."

 Esperou um tempo, resolveu dar uma organizada em sua mochila, o que não tinha conseguido fazer antes devido a correria, e então dormiu. Em seu sonho, apareceu em uma oca, na qual dona Egídia já estava o esperando com seu usual sorriso, sentada em posição de meditação. Ele também sorriu e perguntou:

 - Vai me dizer que a senhora tem algo a ver com aquele vento!
 - Boa noite meu filho, como está?
 - Estou ótimo, graças àquele vento salvador, que me direcionou para a cabana e evitou que me molhasse todo, e a senhora?
 - Bem bem, cada dia mais crente que você conseguirá chegar são e salvo em seu destino, é um menino de muita coragem e fé, mais coragem do que fé.
 - Me explique o que aconteceu hoje, você tem algo a ver?
 - Eu infelizmente não tenho a capacidade de fazer aquilo por você, quem fez foi alguém muito poderoso...ou poderosa, mas só o fez por você merecer naquele momento, não é algo que se vê todo dia.
 - Como é possível algo daquilo? Não influencia no resto da natureza?
 - A natureza é muito poderosa, fique tranquilo com ela, isso não chega perto do dano que seus dejetos do dia-a-dia causam a ela. É necessário tentar com muita força destruí-la para conseguir, mas é claro que muita gente faz isso né?
 - Sim, vejo muita gente fazer muitas coisas contra ela todo dia, principalmente com substâncias químicas que usam para as lavouras e os recipientes que estão em tudo que comemos.
 - Isso aí é só a ponta do iceberg, você não imagina quanta coisa existe para se estudar e questionar em relação à degradação da Mãe Natureza; mas esta tem seus meios de se defender e se preservar, ela não está morta e sim viva, o tempo todo está se movimentando. É exatamente sobre a movimentação que vamos falar hoje, entender o porquê das coisas se movimentarem é essencial para o seu aprendizado. Você sabe para onde vai os seus dejetos quando você usa o banheiro?
 - Uma vez minha professora nos levou para ver, é jogado pela rede de esgoto em um rio.
 - E você acha que estes dejetos vão até o mar?
 - Não sei, mas uma vez estava bem para baixo do rio e ele não estava tão sujo como onde vi o esgoto ser jogado; acho que não.
 - E não mesmo! A movimentação das águas joga os dejetos contra as rochas e vai quebrando-no de pouquinho em pouquinho, até ficar do tamanho que certos peixes e bactérias conseguem comê-los, limpando os rios de certa forma. Depois de uma boa distância nem é mais possível notar qualquer sujeira nas águas. O problema é que em algumas partes ainda é tão sujo que é impossível sobreviver dentro daquelas águas, matando vários peixes e outros animais que precisam da água para sobreviver. Mas agora eu te pergunto, e se caísse em um lago, que não dá para se ver tanta movimentação como em um rio? - Aí eu acho que o dano seria grande.
 - Então, nem tanto, na verdade somente um pouco mais. O lago parece ser parado por fora, não tem o efeito da água batendo nas rochas, porém, ainda existem ali muitas e muitas bactérias e outros seres muito pequeninos que se movimentam sem podermos ver com os olhos nus em velocidades altíssimas. O trabalho é um pouco mais demorado mas ainda assim é feito, o lago pode se limpar. Mas podemos ver esse problema exagerado quando vemos um lago coberto por algas, isto acontece quando o lago está muito sujo por baixo, o que favorece o crescimento destas devido a quantidade de nutrientes para elas. Quando vir um lago assim, nem pense em chegar perto.
 - Bom, mas ainda não estou entendendo muito bem onde quer chegar com esta conversa.
 - Paciência filho, precisamos de alguns outros exemplos para ficar mais claro. Pense em você filho, que se movimenta o tempo todo, gasta energia e precisa de reposição, tanto de energia como de matéria mesmo. Como você faz para repor isto?
 - Comendo e bebendo, uma das coisas que melhor sei fazer.
 - Ótimo, é assim mesmo...algumas vezes tomamos algum remédio que também faz parte deste processo e o ar que respiramos tem uma grande contribuição. Mas e como isto se processa?
 - Bom, a comida entra no meu corpo, algumas coisas importantes são absorvidas por ele e outras são descartadas.
 - Sim, se você olhar para a sua barriga não verá ela se mexendo, mas a comida está o tempo todo se movimentando dentro de você, o que é essencialmente necessário para a boa nutrição. Se ela simplesmente parasse em um lugar e ali ficasse, você não conseguiria se nutrir. Células morrem dentro de você o tempo todo e você precisa de novas, o movimento é essencial para a sua vida, assim como a do rio, assim como a do vegetal que você come depende da água que chega até ela e se movimenta por seus canais. Seres vivos dependem da movimentação contínua de pelo menos alguma coisa, nada vivo está parado neste universo. Mas será que somente o que é vivo? E uma rocha? Ela fica completamente parada?
 - Parece que sim.
 - Engano seu, pedaços muito pequenos das rochas são movimentadas quando o vento ou águas em movimento a tocam. Ela se movimenta pouco, mas movimenta. Algumas vezes se movimentam bastante, quando ocorrem terremotos, que acontecem na maioria das vezes quando grandes placas de rocha se chocam. Um dos grandes fatores a se dar atenção quando se fala em movimentação são os ventos, o ar. É o ar que move rochas, vegetais, move os gametas de muitos vegetais que vão se estabilizar em outros lugares, o ar que é a principal fonte de energia dos nossos movimentos, através da respiração sem a qual poderíamos nos mover, sequer viver. O ar dá movimento e vida para o planeta terra, que também tem uma vida própria. O ar abre barreiras, direciona, como aconteceu hoje contigo. Algumas vezes também traz algumas tragédias com ciclones e ventanias, mas tudo é parte do seu ciclo natural, é uma ação que a natureza necessita para redistribui-lo pelo planeta e voltar à conseguir viver. Você estava correto em se preocupar com o que aconteceu hoje, se poderia ser prejudicial, mas quem proporcionou aquilo sabia o que estava fazendo e não podemos discutir com ele, apenas agradecê-lo.
 - Sim, sou muito grato pelo ocorrido.
 - O mais interessante disso tudo filho, é que o ar é ótimo em obedecer. Ele tem densidade muito pequena, se você assoprá-lo, facilmente ele irá para onde assoprar, é como se ele seguisse a frase “seja feita a vossa vontade” sem contestar quase nada, tem pouca inércia, teimosia, e é exatamente assim que devemos agir com seres como o que te ajudou hoje, sem contestá-lo, pois estão em um plano superior ao nosso. Mas no plano que está em cima acontece como no plano que está embaixo, se aqui devemos respeitar nossos superiores, lá eles respeitam os superiores deles e assim sucessivamente. Se aprendermos a fazer isso e entrarmos em harmonia com eles, eles nos protegerão e ajudarão sempre em nossa caminhada, abrindo caminhos, vencendo demandas e orientando cada coisa para seu devido lugar. Mas a questão é: nunca parar absolutamente, se formos parar, só se for para mudar de sentido. Se pararmos algo acontecerá para nos dar movimento novamente, pois como nós precisamos das coisas se movimentando dentro de nós, o planeta precisa das coisas se movimentando dentro dele para sobreviver.
 - Isto faz bastante sentido, uma vez meu pai disse que a vida começa onde termina a zona de conforto, que eu preciso trabalhar para ter o que comer, não posso ficar somente vendo TV ou ouvindo música. Como hoje, se eu não tivesse caçado aquele peixe, o que realmente deu bastante trabalho, eu não iria ter comida em estoque para outro dia que não conseguir caçar, precisei me movimentar para lutar pela sobrevivência.
 - Perfeito meu filho. Pensando na sua situação fica ainda mais interessante nossa conversa, pois você desenvolveu uma arma, sem a qual provavelmente não iria conseguir capturar aquele peixe. Você estava em um lugar superior ao peixe quando o pegou, com uma arma que ele não seria capaz de se defender, somente se esquivar quado conseguisse. É assim que acontece com planos superiores ao nosso. Devemos nos esquivar e evitar combates com pessoas que possuem armas e inteligência bem mais evoluídas que as nossas, até melhor tentar fazer amigos de lá, pois caso contrário nosso fim será como foi o seu peixe, virando almoço. Se aquele peixe estivesse se movimentando o tempo todo, dificilmente você iria acertá-lo, isso é algo para você pensar. O verdadeiro cetro do poder está na movimentação e, quanto mais você se aprofundar, mais movimento achará dentro das coisas. Os elétrons que compõe os átomos da pedra se movimentam em uma velocidade muito maior da que você pode atingir correndo, e assim vai, tudo se movimenta.
 - Não sei o que é um elétron Dona Egídia.
 - É meu filho, você precisa estudar muito ainda para entender este mundo, mas acredite, tudo se movimenta o tempo todo, o que parece não ser vivo, em algum lugar é mais vivo que podemos imaginar.
 - Se a senhora assim o diz, eu acredito, mas quero estudar mesmo isto agora, estou muito curioso para compreender como a natureza funciona.
 - Fico feliz em ouvir isto, se todos fossem assim, curiosos, o mundo seria muito melhor. Sempre que precisar te ajudarei nos estudos filho. Agora acorde e comece a se movimentar em seu novo dia.
 - Obrigado minha querida, até mais!
 - Até mais meu filho.

 Colorado Teus acordou e o Sol ainda não tinha nascido. Começou a observar que com o nascer do Sol, a floresta começava a tomar vida e se movimentar, movimentar cada vez mais. Os pássaros cantando e indo de uma árvore para a outra, uma brisa fria e gostosa batia em seu rosto e uma energia muito boa podia ser sentida durante a respiração, cada vez melhor de acordo com o Sol nascendo. Os insetos se movimentavam de maneira um pouco caotica, mas ele sabia que cada detalhe ali era essencial para a harmonia de toda a floresta, bastava pensar com mais profundidade no porquê de cada um. Aquele clima de harmonia o encheu de esperança, ele juntou suas coisas e continuou sua caminhada.

Vai dar certo!

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