Por: Soror Coruja
Uma brecha para outra constelação
Por dias o fogão pedia lenha pra queimar e, até vassoura fez fogo levantar. Pra aquecer o corpo, rede do alpendre era pouco, não achávamos que aquele inverno florido seria tão bandido.
Aquele frio medonho fez tudo se atrapalhar, capim no campo congelou e num deu pro gado sustentar. Morreu minha cabra adoidada que tinha mania de profetizar. O leite dos menino, virou pedra a cristalizar.
Em dia de cura, os enfermo se aquecia com um cafezinho amargo cheiroso, tinha um efeito poderoso. Mas até que teve sua compensação, toda aquela geada grossa ajudava na cicatrização.
Lembro de meu pai quando chegava tarde da cidade, tirava a botina e de imediato pisava na brancura do mato.
Seu Roberto por anos deu a vida em defesa das terras, vivia a cavalgar pelos morros e serras. Conheceu Dulce minha mãe na cidade, acabou perdendo a identidade. Não teve sorte, passou a vida com medo da morte.
Depois de muita sofreguidão, de insônia e retidão, fomos acolhidos pelos braços da noite de primavera, mais parecia uma quimera.
De manhãzinha, Dolores na panela de barro, e Seu Tomás com flores enfeitava o jarro. Era dia de celebrar de forma singela, a abertura da nossa capela. Primavera era assim, muitas árvores e flores pra admirar, e ar bom pra respirar.
Naquela tarde teve uma moça barriguda pronta pra casar, e nossa capela estreiar. Com muita fé e devoção, o vaqueiro Ramon pra moça pediu a mão. Eu segurei firme o rosário, e me veio foi um mau presságio. Perto do cruzeiro, um arrastão de trastes chegavam, derrubando bambuzeiro.
Voltei minha atenção pro casório, e até acabado já tinha, eu ainda sentada no pé do altar, fiquei fria de assustar. Rezei o credo as avessa, mas a alma continuava a congelar.
E eu pensava comigo, que diabo esse povo queria, aquele cheiro de matança, imagem de corpo sem esperança. Se eu comentasse iam chamar de feitiçaria.
Eu ainda confusa, a moça a pouco casada estava conduzindo seu primeiro filho, comecei a cantar, então vi de perto mais um filho na serra do nevoeiro brotar. Aos meus olhos, sentia ser o último a renascer e por aquelas mouros crescer.
Seu Tomás com uma cuia achegou no casarão, e fincou seu punhal no chão, mostrou que naquele pacífico, os recursos minerais era motivo de sacrifício, disse ele que podíamos além do mar viajar, mas que da invasão, vivos não tínhamos como escapar.
Por noites cavalguei até o cruzeiro, e de longe observei o som de tudo que passava por lá, mata gentil foi aquela minha terra, e entendi que de uma serra a outra das cordilheiras havíamos de emigrar.
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