1 de out. de 2015

O que é a Umbanda?

Por: Colorado Teus

Saudações,

enquanto eu escrevia uma série de textos sobre a Umbanda para o Queremos Querer, me deparei com alguns problemas de rigor nas pesquisas que fazia sobre o tema, nunca conseguindo compilar as informações num nível de conhecimento aceitável para a minha lógica.



Ao meu ver, existem muitos problemas em tentar transmitir a Doutrina Umbandista (principalmente pela internet), e o primeiro e mais importante é: existe uma Doutrina Umbandista?

Como fundamentar a Umbanda? Existe algum conjunto de dogmas que vale para todos os terreiros? Existe uma ideia central por trás dessa egrégora?

Obviamente, para ser uma egrégora o grupo necessita estar fundamentado em uma ideia central, mas qual é ela? Seria a primeira manifestação de Zélio de Moraes? Seriam as manifestações de diversos médiuns que incorporaram espíritos que se diziam da Umbanda mas nunca tinham tido contato com o Zélio?

Esse assunto é extremamente complicado uma vez que não há como provar a veracidade das informações transmitidas por todos os espíritos e nem das diferentes 'linhas' que foram surgindo ao longo do tempo. Seria a Umbanda Sagrada a verdadeira Umbanda? Ou a Umbanda Branca? Ou a Umbanda Esotérica? ou qualquer outra linha que tenha surgido?

Mas e se forem todas corretas ao mesmo tempo?

Se pensarmos na Umbanda como a religião fundada por Zélio de Moraes juntamente ao Caboclo das 7 Encruzilhadas, em que "Aos menos evoluídos ensinaremos, com os mais evoluídos aprenderemos e a ninguém renegaremos" e "A Umbanda é a manifestação do espírito para a prática da caridade", quase todas elas seriam verdadeiras, mudando a-penas a FORMA que cada uma faz isso.

Os símbolos, rituais, regras, formas de preparação, tudo isso faz parte do exoterismo de cada casa, são apenas, como eu disse, as formas que as pessoas usam para tentar chegar aos propósitos de caridade a aprendizado. A parte esotérica, a principal, fica num espaço em que não entra nenhum símbolo, paramento ou assentamento, fica no interior de cada pessoa e nas realizações que ela consegue materializar. Porém, é comprovável empiricamente que a parte exotérica pode ajudar sim na organização e equilíbrio energético do médium/consulente, assim, muitas pessoas acabam confundindo o meio com o fim e ficam brigando para ver qual pai/mãe de santo é melhor (quem tem mais guias, quem recebe a entidade mais evoluída, quem tem mais assentamentos, quem tem mais tempo de Umbanda, quem buscou o fundamento com o sacerdote africano mais respeitável etc.).

Para ficar bem claro meu ponto de vista em relação a isso, em momento algum eu disse que a organização mágico/religiosa não é importante, é importante, mas não o objetivo.

Quer complicar ainda mais a questão? Onde entram os Orixás nessa história? O que são Orixás?
Algumas linhas de Umbanda fundamentam todos os atos religiosos nos Orixás, enquanto outras sequer aceitam a existência de tais seres com as capacidades que dizem que os Orixás têm. Como eu perguntei anteriormente, tudo na Umbanda necessita estar ligado com o que foi passado pelo Zélio em si ou aceita-se a entrada de novos conhecimentos, uma vez que o próprio Zélio nunca teve qualquer ligação direta com os cultos de nação?

Se formos seguir o próprio ensinamento do primeiro dia, citado anteriormente, a Umbanda deve sim estar aberta à entrada dos ensinamentos de qualquer origem, desde que tragam aprendizagens. A ninguém renegar significa não virar as costas pro negro, pro amarelo, pro vermelho, pro branco, pro mendigo, pro milionário, pro bruxo, pro mago, pro feiticeiro, pro anjo, pro demônio etc. Isso significa total abertura para os conhecimentos das diversas áreas. Acredito que, pelo conhecimento trazido pelos participantes das giras, a Umbanda acabou se ligando cada vez mais aos cultos de nação, até porque, de lá vem um pouco do pouco de magia (que é um procedimento muito usado para ajudar no processo de manifestação do espírito) que temos nesse país. Assim, além da anexação do culto aos Orixás na religião de Umbanda, também houve uma 'africanização' dos objetos, nomes e signos utilizados em seus centros.

E isso não tem nada de errado se usarmos como premissa as duas primeiras frases citadas de Zélio de Moraes.

Nesse ponto entraríamos em um novo problema: qual sistema africano utilizar? As fontes são confiáveis?

Meus amigos, estudar nomes, pronúncias, atuações ou qualquer coisa sobre Orixás é muito difícil. O que temos no Brasil hoje sobre os cultos afro é resultado de um empilhamento de conhecimentos de várias tribos provenientes de várias regiões diferentes da África, com pessoas que tinham divergências de crenças e outras que inventaram um monte de coisas, e, sendo a "cereja do bolo", uma maioria analfabeta que só transmitia o conhecimento para quem queria e da forma que queria. Ou seja, qual a chance de que isso que temos hoje seja um conhecimento puro?

Usei a palavra "puro" e não "verdadeiro" justamente porque ainda existe a discussão se algo é verdadeiro se, e somente se, for de uma tradição e não tiver sido mexido. O conhecimento não pode se transformar de acordo com que o próprio ser humano transforma? Ou é uma mistura de transforma sem mudar a essência?

É possível criar uma tradição? Ou tradição é algo que, por ser bom, durou mais do que o normal? Notem o quanto a palavra tradição está ligada com as palavras 'hegemônico', 'puro' e/ou 'dominador'. Essas palavras indicam algo ruim? Não necessariamente, podem ou não conforme o caso. Mas quanto menos mediunidade o dirigente tiver, mais ele necessitará se apegar à tradição.

Ao mesmo tempo, quando se faz um rito com cada detalhe conforme diz a tradição, o fator dúvida é eliminado pelo pensamento 'para o rito fazer parte da tradição precisa ter dado certo para muitas pessoas'. E a eliminação da dúvida é um passo muito grande na realização mágica, que exige confiança. Ao passo que a dúvida é o que move o ser humano, é a dúvida que coloca a pessoa em movimento para buscar novas coisas e evoluir, sair de sua própria tradição em errar.

Concluindo essa reflexão, pensar em uma tradição seria ir contra a ideia do constante aprendizado apresentado por Zélio de Moraes; fechar a cerca, ou doutrinar, seria de fato paralisar o crescimento da religião, porém, ao mesmo, tempo, isso ajuda aos médiuns a se equilibrarem e conseguirem boas manifestações do espírito para a prática da caridade. A Umbanda vive hoje esse paradoxo que a maioria dos praticantes ainda não conseguiu neutralizar, até porque acredito que a dose certa de 'tradição' e de 'evolução' em seu fundamento varia de pessoa para pessoa; sendo assim, deveríamos, mais uma vez, seguir o velho conselho que quase todos os pretos velhos nos dão durante os atendimentos: "Siga o seu coração e não deixe a cabeça ficar atrapalhando suas decisões". Dessa forma, vêm surgindo diferentes tradições dentro da Umbanda e, por mim, não há problema nenhum nessas diferentes sistematizações enquanto os praticantes souberem diferenciar o que é o 'meio' e o que é o 'fim'.

Vai dar certo!

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